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Uso consciente do Pronto-Socorro salva vidas
De cada dez pessoas que procuram o PS, em média, sete não são casos de urgência. Santa Casa de Mogi das Cruzes orienta população a procurar unidade certa para cada tipo de atendimento, evitando causar vítimas fatais por sobrecarga do sistema.
O Pronto-Socorro (PS) da Santa Casa de Misericórdia funciona 24 horas por dia nos sete dias da semana. É um serviço médico-hospitalar para casos de urgência e emergência. “Quando você usa mal o Pronto-Socorro, prejudica o atendimento de quem está em risco de morte”, alerta o vice-provedor do hospital filantrópico, Flávio Ferreira Mattos, ao assinalar que o respeito ao propósito do PS garante que aqueles que realmente precisam de cuidados urgentes recebam atenção rápida e eficaz.
A rede pública de saúde dispõe de equipamentos para atender diferentes casos. A porta de entrada para pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS) são as Unidades Básicas de Saúde (UBS) e Unidades de Saúde da Família (USF). Estão aparelhadas para solucionar cerca de 80% das necessidades de assistência apresentadas pelos usuários, oferecendo pré-natal, pediatria, acompanhamento de doenças crônicas como hipertensão e diabetes, além do tratamento de tuberculose e hanseníase. É onde o paciente deve buscar atendimento para consultas, tratamentos, vacinas, injeções, curativos, trocas de sondas e renovação de receitas. Em Mogi das Cruzes, os agendamentos são realizados pelo telefone 160, do Sistema Integrado de Saúde (SIS). A Prefeitura mantém convênio com a Santa Casa para atendimento dos munícipes no Pronto-Socorro do hospital.
O sistema mogiano de saúde pública também conta com três Unidades de Pronto Atendimento (UPA), localizadas no Rodeio, Oropó e Jundiapeba. Todas têm funcionamento ininterrupto e capacidade para atender mais de 90% dos pacientes sem necessidade de encaminhamento ao pronto-socorro hospitalar. Apresentam estrutura física e operacional para tratar urgências e emergências relacionadas à febre e pressão arterial altas, fraturas, cortes, infarto e Acidente Vascular Cerebral (AVC). Estão diretamente ligadas ao Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu).
Ao procurar o Pronto-Socorro da Santa Casa com problemas de saúde que podem ser atendidos em outros equipamentos, o paciente retarda a assistência para casos de urgência e emergência, que são o foco da unidade. “Isto sobrecarrega o sistema, porque desvia estrutura e pessoal para atendimentos sem a prioridade daqueles que estão com a vida em risco”, explica Mattos. Ele propõe a união dos gestores de saúde, num trabalho conjunto com a Prefeitura, para viabilizar a produção de um Guia de Orientações ao Uso do SIS. Ideia do vice-provedor é que a campanha educativa seja levada às escolas e entidades sociais assim como aos profissionais de saúde, por meio de palestras.
Alta demanda
De acordo com a supervisora de Enfermagem do Plantão Noturno do Pronto-Socorro da Santa Casa, Kátia Aparecida dos Santos, é comum as pessoas procurarem o serviço de urgência e emergência para tratar uma dor crônica, que se arrasta há meses, para internação de um etilista (dependente de álcool), lavagem de ouvido para remover o cerúmen (cera), trocar receituário médico, renovar curativos, obter atestado para justificar falta ao trabalho e até para fazer um teste de gravidez. “São serviços disponíveis na rede básica de saúde, bastando fazer o agendamento. Não faz sentido buscar atendimento no Pronto-Socorro”, observa.
Esses pacientes não catalogados como urgência e emergência superlotam o PS e, como recebem a classificação de caso sem gravidade, aguardam bastante tempo. Muitos ficam impacientes e interrompem frequentemente a rotina da triagem cobrando exames e atendimento. Isso prejudica o fluxo de trabalho. “A gente fica com dificuldade para prestar assistência qualificada a quem realmente precisa de socorro. Outros disparam xingamentos e chegam a agredir os profissionais de saúde. Surge um clima de terror que só trava o desempenho das equipes”, lamenta a enfermeira, ao relatar acontecimentos protagonizados quase sempre por pacientes que não deveriam ser tratados no pronto-socorro.
De cada dez pessoas que procuram o PS da Santa Casa, em média, sete não são casos de urgência. A estimativa de Kátia vem acompanhada das orientações dadas a esses pacientes. Por exemplo, o PS intervém para conter convulsões sofridas por etílicos. Mas, o fundamental é que eles procurem o devido tratamento na rede básica de saúde. Os mogianos dispõem de programas municipais e também do Centro de Atenção Psicossocial-Álcool e Drogas (Caps-AD).
Em outro exemplo, Kátia detalha que é atendimento de urgência o caso de alguém com dor de ouvido. Já a limpeza do cerúmem é um procedimento oferecido em UBS. O mesmo vale para testes rápidos de HIV, sífilis e outras doenças sexualmente transmissíveis. Ela lembra que estão disponíveis na rede básica de saúde. Também cresce o número de pessoas que buscam o PS após picadas de cobra e aranha, assim como mordidas de cães e gatos.
Em Mogi, o Hospital Luzia de Pinho Melo é o único que dispõe de soro para tratar vítimas de picadas de animais peçonhentos. “Quando o PS da Santa Casa recebe esse paciente, precisa arrumar ambulância para transportá-lo até lá. É um tempo precioso de socorro médico, perdido na logística de locomoção. Seria bem diferente se a pessoa fosse diretamente ao local certo”, relata a enfermeira, assinalando que aquela unidade presta socorro imediato para esses casos. Ela também informa que a vacina antirrábica só está disponível na UPA Rodeio.
Fluxo de atendimento
Quando o paciente chega ao PS retira uma senha, que pode ser de atendimento prioritário a quem tem mais de 80 anos, preferencial para 60+ e para Pessoa com Deficiência (PCD), gestante, pediatria, ou normal. A recepção faz a ficha e o encaminhamento para a triagem, onde um enfermeiro treinado irá aferir pressão arterial, saturação, temperatura e o dextro (medição dos índices de glicose no sangue) para diabéticos.
Na triagem são apurados os sinais e sintomas do paciente para a classificação da espera por assistência: vermelho (imediato) para casos gravíssimos em que há risco de morte; laranja (até 10 minutos) para situações muito urgentes, como cólica renal; amarelo (até 1 hora) para urgências, como pressão alta e glicemia descontrolada; verde (de 2 horas) para pouca urgência, como febre não esclarecida e mal-estar; e azul (até 4 horas) para as não urgências, como resfriado, escoriações e outros males que poderiam ser tratados em UBS ou numa das UPA da Cidade.
“A dor é um dos principais indicadores do nível de urgência do atendimento. Se a pessoa tem dor, as equipes do PS fazem o impossível para atendê-la com a maior agilidade e eficácia”, aponta Kátia. No entanto, pondera, o uso consciente do Pronto-Socorro ainda é uma prática distante. Segundo ela, na fila de espera, é comum encontrar mães com crianças que precisam trocar talas para imobilização ortopédica porque o dispositivo molhou, sujou ou está estragado. “É um procedimento a ser feito no ambulatório durante o dia; não no PS e ainda mais à noite”, alinhava.
Há ainda pessoas com sequelas de AVC queixando-se de perda de força motora. “Ao aprofundar os detalhes, descobrimos que o paciente sofre do problema há meses, mas resolveu ir para o PS em vez de passar por consulta médica na rede básica de saúde”, lamenta a supervisora.
“Penso num cenário ideal em que as pessoas conheçam o que a Prefeitura oferece no campo da saúde pública. São serviços, incluindo tratamento e transporte, totalmente gratuitos. E que elas procurem o Pronto-Socorro quando realmente seja necessário. Todo mundo sai ganhando: o paciente porque tem seu problema resolvido com maior rapidez; o profissional de saúde que pode proporcionar o atendimento de excelência que ele foi treinado para prestar”, manifesta-se Kátia, pedindo que a população se esforce um pouco para garantir o uso consciente do PS e o respeito às equipes de saúde que se dedicam tanto ao funcionamento adequado da unidade.
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